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O desafio dos preços moderados das commodities na América Latina

Na América Latina e no Caribe, os preços elevados de commodities como o café e o cobre já foram o principal motor do crescimento, ajudando os países a elevar a renda e reduzir a pobreza. Mas níveis de preços moderados e estáveis significam que, no futuro, será preciso buscar fontes alternativas de crescimento inclusivo.

Dependência das commodities

A região da América Latina e Caribe é rica em terras férteis, minérios, petróleo, gás natural e carvão. Suas economias lideram a exportação de café (Brasil, Colômbia e América Central), cobre (Chile e Peru), minério de ferro (Brasil), petróleo e gás (Bolívia, Colômbia, Equador, México, Trinidad e Tobago e Venezuela) e soja (Argentina, Brasil e Uruguai).

Como as economias da região são altamente dependentes da exportação de commodities, a atividade econômica, as receitas do governo e o saldo em transações correntes são suscetíveis a choques no preço dos produtos primários.

Especificamente, um estudo anterior do FMI constatou uma forte correlação entre o crescimento da América Latina e as variações nos preços das commodities. Portanto, a expectativa em relação aos preços desses produtos é essencial para projetar as perspectivas econômicas da região.

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Uma retomada efêmera nos preços das commodities

Após uma alta de 55% entre janeiro de 2016 e junho de 2018, o índice de preços de commodities do FMI recuou 9,7% nos oito meses seguintes. A queda foi liderada pelos preços dos produtos de energia, que baixaram 17% entre junho de 2018 e fevereiro de 2019, enquanto alimentos e metais caíram 4,5% e 0,6%, respectivamente.

Os preços dos metais começaram a ceder em março de 2018, quando foram impostas tarifas sobre o aço e o alumínio. Esse recuo também reflete um certo enfraquecimento da produção industrial chinesa.

Os preços agrícolas atingiram um pico em junho e começaram a declinar lentamente após a imposição de tarifas sobre as importações de soja, milho e trigo. Os preços do petróleo caíram em outubro e novembro, estabilizando-se então em um nível mais baixo. Em parte, isso ocorreu devido ao crescimento global mais fraco e a fatores transitórios que determinaram condições de excesso de oferta no mercado de petróleo.

Perspectivas e riscos

Nossa análise indica que os preços das commodities são voláteis e sujeitos a fatores de risco e incertezas globais. As taxas de juros internacionais, a apreciação do dólar norte-americano, o crescimento mundial e fatores do lado da oferta influenciam fortemente as oscilações nos preços da maioria das commodities, dificultando sua projeção.

Os mercados futuros, onde os participantes compram e vendem commodities para entrega em uma data específica, indicam que os preços do petróleo devem se manter ao redor dos níveis atuais nos próximos anos. Embora o balanço dos riscos para as perspectivas seja neutro, a incerteza é substancial, principalmente quando se leva em conta a situação política da Venezuela e as tensões no comércio global. O aumento da produção de petróleo nos EUA e a desaceleração do crescimento da economia global têm o potencial de reduzir os preços, enquanto interrupções na oferta e um crescimento mundial mais forte poderiam elevá-los.

Espera-se também que os preços dos metais básicos como o cobre permaneçam estáveis, próximos dos níveis atuais, com um grau elevado de incerteza. A evolução dos preços dos metais dependerá em grande medida das perspectivas econômicas da China, o maior consumidor mundial dessas mercadorias.

Em relação aos preços dos alimentos e bebidas, a expectativa é de um ligeiro aumento. Os agricultores da América Latina e Caribe poderiam se beneficiar de uma alta nos preços do milho, trigo, soja e café.

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Dado o grande peso da China no mercado de commodities, a negociação de um acordo comercial com os EUA poderia levar a uma recuperação nos preços.

Essa recuperação beneficiaria os exportadores de energia e metais da América Latina e do Caribe, mas não necessariamente os exportadores de produtos agrícolas da região favorecidos pelas tensões comerciais recentes, que geraram um prêmio no preço de sua soja. O fenômeno El Niño, padrão climático de aquecimento das águas oceânicas, poderia prejudicar os exportadores de produtos agrícolas, mas os preços mais altos dos alimentos devem compensar parcialmente esse efeito.

Impacto regional

O impacto dos choques nos preços das commodities é diferente em cada país e depende da composição de suas importações e exportações. Uma forma concisa de analisar esse impacto é pelo exame dos índices dos termos de troca das commodities, que apresentam a razão entre os preços médios das commodities exportadas e os das commodities importadas.

O índice dos termos de troca mostra os países mais beneficiados e prejudicados por uma alteração nos preços de commodities específicas. Por exemplo, quando os preços do petróleo caíram no final de 2018, importadores líquidos dessa mercadoria, como o Chile e o Uruguai, foram beneficiados, enquanto os exportadores líquidos, como a Venezuela e a Colômbia, foram prejudicados.

Chart 3 

Estudos anteriores constataram que uma alta nos termos de troca das commodities impulsiona temporariamente o crescimento econômico. Isso ocorre sobretudo nas economias onde as exportações de commodities têm uma participação importante no PIB; o crescimento retorna aos níveis pré-choque quando o investimento e o consumo se ajustam ao nível mais elevado dos termos de troca.

O caminho a percorrer

Esses resultados sugerem que a alta passageira nos preços das commodities entre o início de 2016 e meados de 2018 ajudou a estimular o crescimento na região da América Latina e Caribe, particularmente nos países andinos. Contudo, a perspectiva de preços estáveis indica que é pouco provável que os preços das commodities sejam um motor de crescimento expressivo para a região nos próximos anos.

Essa perspectiva reforça a necessidade de que as economias da América Latina e Caribe acelerem a implementação de reformas estruturais para estimular o crescimento e melhorar os resultados sociais.

As prioridades básicas são a maior abertura ao comércio e ao investimento estrangeiro direto, a simplificação dos regulamentos dos mercados de produtos e de trabalho, o estímulo à concorrência, o investimento em educação e infraestrutura, bem como a preservação ou expansão de programas sociais bem direcionados.

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Christian Bogmans é economista da Unidade de Commodities do Departamento de Estudos do FMI. Seus principais campos de pesquisa são a economia do meio ambiente e da energia e o comércio internacional, com ênfase na relação entre comércio, recursos naturais e meio ambiente. Antes de ingressar no FMI, foi professor adjunto na Universidade de Birmingham, no Reino Unido. Doutorou-se em economia pela Universidade Tilburg.

Jorge Restrepo, de nacionalidades chilena e colombiana, é Economista Sênior da Divisão de Estudos Regionais do Departamento do Hemisfério Ocidental do FMI. Ingressou no FMI em 2010 e, antes de se transferir para a Divisão de Estudos Regionais, trabalhou no Instituto do FMI para o Desenvolvimento de Capacidades, onde ministrou cursos sobre política fiscal e monetária, modelos econométricos e modelos estocásticos dinâmicos de equilíbrio geral. Anteriormente, trabalhou por 10 anos no Departamento de Estudos Econômicos do Banco Central do Chile, tendo trabalhado também no Banco Central da Colômbia. Doutorou-se em economia pela Universidade de Nova York. Seus campos de pesquisa incluem estudos sobre metas de inflação, demanda de moeda, nível de equilíbrio do desemprego, regras fiscais e balanços dos bancos centrais.