Grupo de mulheres em um evento em São Paulo para promover a participação feminina no setor financeiro: as mulheres representam 51% dos mutuários no Brasil (Sebastião Moreira/Newscom) Grupo de mulheres em um evento em São Paulo para promover a participação feminina no setor financeiro: as mulheres representam 51% dos mutuários no Brasil (Sebastião Moreira/Newscom)

Mulheres nas finanças: Um argumento econômico para a igualdade de gênero

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As mulheres estão sub-representadas em todos os níveis do sistema financeiro mundial, de depositantes e mutuários a membros de conselhos de administração de bancos e órgãos reguladores.

Nosso novo estudo constata que a maior inclusão das mulheres como usuárias, provedoras e reguladoras de serviços financeiros geraria benefícios muito além do combate à desigualdade de gênero. Reduzir a disparidade de gênero fomentaria a estabilidade do sistema bancário e estimularia o crescimento econômico. Contribuiria também para tornar mais eficazes as políticas monetária e fiscal.

Segundo os resultados de um levantamento do FMI publicado este ano — a primeira vez em que dados desse tipo foram disponibilizados —, as mulheres representavam, em média, apenas 40% dos depositantes e mutuários dos bancos em 2016. Esses números agregados encobrem grandes variações entre as regiões e os países. Por exemplo, as mulheres somavam 51% dos mutuários no Brasil, em comparação com apenas 8% no Paquistão.

É cada vez mais evidente que o maior acesso e uso dos serviços financeiros pelas mulheres pode gerar benefícios econômicos e sociais. Por exemplo, no Quênia, as comerciantes que abriram uma conta bancária simples investiram mais em seus negócios. No Nepal, as famílias chefiadas por mulheres gastaram mais em educação após abrir uma conta poupança.

Sistemas financeiros mais inclusivos podem ampliar a eficácia das políticas fiscal e monetária.

Tais benefícios ilustram por que o maior acesso aos serviços financeiros eleva o crescimento econômico. O uso mais intensivo desses serviços pelas mulheres também produz resultados positivos. Sistemas financeiros mais inclusivos, por sua vez, podem ampliar a eficácia das políticas fiscal e monetária ao expandir os mercados financeiros e a base tributária.

Quando as mulheres lideram as finanças

Mas e o sistema financeiro propriamente dito? Faz alguma diferença se as mulheres estão representadas entre os banqueiros e as autoridades de supervisão?

Em um estudo anterior, mostramos que ainda há grandes lacunas entre a representação de homens e mulheres em posições de chefia nos bancos e órgãos de supervisão bancária em todo o mundo.

Constatamos que as mulheres ocupavam menos de 2% dos cargos na diretoria executiva das instituições financeiras e menos de 20% das cadeiras nos conselhos de administração. A proporção de mulheres nas diretorias dos órgãos de supervisão bancária também era baixa: apenas 17%, em média, em 2015.

Assim como no caso dos usuários de serviços financeiros, encontramos diferenças regionais consideráveis na presença de mulheres em cargos de liderança nos bancos. Os países da África Subsaariana apresentaram o maior número de executivas bancárias, e a América Latina e o Caribe, o menor. As economias avançadas situavam-se entre os dois extremos.

Constatamos que a disparidade de gênero nos cargos de liderança faz diferença em termos de estabilidade bancária. Bancos com maior participação de mulheres no conselho tinham mais reservas de capital, uma proporção menor de empréstimos improdutivos e mais resistência ao estresse.

Encontramos a mesma relação entre estabilidade bancária e a presença de mulheres nos conselhos de regulamentação de bancos.

O que explica esses resultados? Existem quatro possíveis razões para que uma maior proporção de mulheres nos conselhos de administração e nos órgãos de supervisão bancária possa contribuir para a estabilidade financeira:

Com base nos dados do nosso estudo e na bibliografia relacionada, concluímos que a maior estabilidade observada provavelmente se deve aos efeitos benéficos da maior diversidade de opiniões nos conselhos, bem como a práticas de recrutamento e seleção discriminatórias que levam à contratação de mulheres mais qualificadas ou mais experientes do que os homens.

Nossas constatações reforçam os argumentos a favor da inclusão financeira das mulheres para aumentar o crescimento econômico e promover a estabilidade financeira.

Precisamos de mais estudos e dados melhores para explicar como obter esses benefícios e identificar as condições que facilitam o acesso das mulheres a cargos de liderança nos bancos e órgãos de supervisão.

 

Agradecemos as importantes contribuições de coautores anteriores: Papa N’Diaye, Adolfo Barajas, Srobona Mitra, Annette Kyobe, Yen Nian Mooi e Seyed Reza Yousefi, bem como da equipe do Departamento de Estatística do FMI encarregada do levantamento sobre o acesso a serviços financeiros (Financial Access Survey).

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Ratna Sahay é Subdiretora do Departamento de Mercados Monetários e de Capitais do FMI. Anteriormente, trabalhou nos Departamentos Financeiro, de Estudos, da Ásia, da Europa, do Oriente Médio e do Hemisfério Ocidental do FMI, tendo liderado importantes projetos analíticos e sobre políticas, além de haver chefiado várias missões a países de mercados emergentes. Colaborou com numerosos artigos nas principais publicações especializadas, tratando de temas como efeitos de contágio nos mercados financeiros e crises financeiras, inflação, crescimento econômico, política fiscal e sustentabilidade da dívida, e economias em transição. Lecionou em instituições como a Universidade de Delhi, a Columbia University e a New York University. É doutora em Economia pela New York University.

Martin Čihák é Assessor no Departamento de Mercados Monetários e de Capitais do FMI, onde participa da análise dos mercados de capitais mundiais. Seu trabalho também abrange avaliações da estabilidade financeira e testes de estresse, o aprofundamento financeiro, a inclusão financeira, a regulamentação do setor financeiro e o papel do Estado nas finanças. Já abordou esses e outros temas em uma grande variedade de artigos e publicações, bem como em inúmeras missões do FMI e do Banco Mundial. Entre 2011 e 2013, trabalhou no Grupo Banco Mundial, liderando a equipe do Global Financial Development Report. Antes de ingressar no FMI em 2000, foi analista-chefe em um banco comercial, professor universitário e assessor governamental. É doutor em Economia e mestre em Economia e Direito.